Na rotina da fonoaudiologia neurológica, episódios de AVC (acidente vascular cerebral) e TCE (traumatismo cranioencefálico) são dois dos maiores desafios para o profissional de reabilitação fonoaudiológica. Além de disfagia, disartria e apraxia de fala, muitos pacientes chegam com afasias complexas, lentificação cognitiva, fadiga mental e dificuldades importantes de atenção e memória.
Sabemos que o prognóstico depende da intensidade e da precocidade da reabilitação. Mas, também sabemos que, mesmo com protocolos bem estruturados, parte dos pacientes entra em um platô funcional: mantêm pequenos ganhos, porém sem o salto de performance que devolve a autonomia comunicativa.
Esse “teto” terapêutico tem muito a ver com a fisiopatologia cerebral pós-lesão: hipoperfusão, inflamação crônica, disfunção mitocondrial e redes neurais desorganizadas. É nesse contexto que a fotobiomodulação transcraniana (FBMt) atua como recurso adjuvante, não invasivo, favorecendo a neuroplasticidade e a responsividade às terapias comportamentais – incluindo a fonoterapia.
O parecer da SBFa 02/2020, elaborado pelos Departamentos de Disfagia, Motricidade Orofacial e Voz da SBFa, concluiu que o uso da fotobiomodulação com fins fonoaudiológicos constitui exercício legal da profissão, uma vez que os objetivos são habilitar e reabilitar, prevenir agravos e otimizar o trabalho do terapeuta e o ganho do paciente.
O que é FBMt e por que ela interessa à reabilitação fonoaudiológica?
A fotobiomodulação transcraniana (FBMt) utiliza luz vermelha e infravermelha próxima (NIR) aplicada sobre o crânio, com baixa potência, sem efeito térmico relevante. Esses fótons são absorvidos principalmente pelo citocromo c oxidase, na cadeia respiratória mitocondrial, aumentando a síntese de ATP, modulando o estresse oxidativo e favorecendo a homeostase celular.

Representação esquemática que detalha os efeitos da FBMt no AVC isquêmico. As cascatas resultantes da ativação do CCO levam à redução do estresse oxidativo, da inflamação e da apoptose, além do aumento da neuroplasticidade e angiogênese, contribuindo para a reabilitação funcional.
LI, Siyue; WONG, Thomson W. L.; NG, Shamay S. M. Potential and challenges of transcranial photobiomodulation for the treatment of stroke. CNS Neuroscience & Therapeutics, v. 30, n. 12, p. e70142, dez. 2024. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39692710/.
Entre os efeitos descritos na literatura científica, estão:
- liberação de óxido nítrico (NO), com vasodilatação e maior perfusão local;
- aumento do metabolismo de glicose e oxigênio;
- modulação de processos inflamatórios;
- estímulo à neurogênese e à sinaptogênese em zonas perilesão em modelos animais de AVC e TCE.
Na prática, estamos falando de um cérebro, após a FBMt, com mais energia disponível, melhor irrigação e ambiente bioquímico mais favorável para reorganização de redes de linguagem e funções executivas.
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Evidências em casos pós-AVC: a linguagem volta a se organizar
Melhora na nomeação e na conectividade funcional
Naeser e colaboradores publicaram uma série de casos com pessoas com afasia crônica (2–18 anos pós-AVC de hemisfério esquerdo) submetidas a 18 sessões de FBMt com LEDs vermelhos e infravermelhos. O protocolo considerado ideal combinou:
- aplicações em regiões perilesionais do hemisfério esquerdo,
- mais dois pontos de aplicação em nós da Default Mode Network (DMN) – córtex pré-frontal medial e pré-cúneo.
Resultados principais:
- melhora significativa na nomeação, especialmente nos pacientes tratados com o protocolo otimizado;
- aumento da conectividade funcional em três redes intrínsecas:
- DMN (p < 0,0005),
- rede de saliência (p < 0,0005) e
- rede executiva central (p < 0,05).
Ou seja, além do ganho comportamental (nomeação), houve evidência objetiva de reorganização de redes neurais associadas à linguagem e cognição.
Caso clínico: fonoterapia isolada x fonoterapia associada à FBMt
Estrada-Rojas e Cedeño Ortiz relataram o caso de uma mulher de 38 anos, com AVC isquêmico em hemisfério esquerdo, que recebeu dois blocos de tratamento de 5 meses:
- Primeiros 5 meses – apenas fonoterapia tradicional:
- pouca ou nenhuma melhora em disartria e linguagem expressiva;
- fala lenta, cerca de 25–30 palavras/min;
- enunciados de 4–6 palavras, com estrutura gramatical simples.
- Cinco meses seguintes – FBMt + fonoterapia:
- aplicação pontual com cluster de LEDs em oito alvos do hemisfério esquerdo (pólo frontal, córtex pré-frontal, giro frontal inferior/Broca, giro supramarginal, giro angular, área motora/sensorial da boca, giro temporal superior posterior/Wernicke e sulco temporal superior);
- em seguida, foi usado o capacete de FBMt com 256 LEDs NIR, utilizado durante 20 minutos enquanto a paciente realizava tarefas de fala e linguagem.
Ao final do segundo bloco de tratamento:
- a taxa de fala aumentou para +80 palavras/min;
- enunciados passaram a ter 9–10 palavras, com maior complexidade sintática;
- melhora visível de inteligibilidade e fluência.
Para a fonoaudiologia, esse caso ilustra algo relevante: o mesmo protocolo de terapia, quando acoplado à FBMt, produziu ganhos que não haviam surgido nos cinco meses iniciais.
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Evidências em TCE: melhoria nas redes de atenção e funções executivas no cérebro
Naeser e colegas descreveram, em editorial e estudos subsequentes, que o TCE leve ou moderado frequentemente cursa com disfunção de redes como DMN, rede executiva central e rede de saliência – áreas críticas para atenção, inibição, flexibilidade cognitiva e controle comportamental.
Em um estudo aberto com adultos com TCE crônico, 18 sessões de FBMt com LEDs vermelhos/infravermelhos aplicados em vértice, regiões frontais, parietais e temporais bilaterais resultaram em:
- melhora significativa em funções executivas e memória verbal;
- relatos de melhora do sono e redução de sintomas de transtorno de estresse pós-traumático;
- manutenção dos ganhos por pelo menos 2 meses após o fim do tratamento.
Esses achados sugerem que a FBMt pode:
- aumentar a eficiência de redes atencionais e executivas;
- reduzir a fadiga cognitiva;
- melhorar a disponibilidade mental do paciente para engajar-se em tarefas de linguagem, fala e deglutição.
O que tudo isso significa para a prática do fonoaudiólogo?

A FBMt é um recurso para potencializar a reabilitação fonoaudiológica
Sumarizando, os estudos apontam que a FBMt:
- melhora a perfusão e o metabolismo em áreas corticais envolvidas em linguagem;
- favorece a neuroplasticidade em redes de nomeação e processamento sintático;
- impacta positivamente funções que sustentam a reabilitação fonoaudiológica (atenção, memória de trabalho, velocidade de processamento, sono, humor).
Na prática clínica, isso se traduz em:
- mais capacidade de manter e generalizar estratégias comunicativas;
- melhor resposta a tarefas de fluência verbal, nomeação e construção frasal;
- aumento do rendimento das sessões, especialmente em casos crônicos que já vinham em platô.
Como integrar a FBMt aos protocolos de reabilitação fonoaudiológica
No cenário de equipamentos como capacetes clínicos de LEDs NIR e bonés hands-free para uso domiciliar (Infrallux e Neurollux, por exemplo), a integração pode ocorrer em dois níveis:
- Ambulatório/clínica
- Sessões de aproximadamente 20 minutos, 1–3x por semana, antes ou durante a fonoterapia, conforme avaliação individual realizada por profissional de saúde;
- Indicação prioritária em afasias, disartrias, déficits de atenção e funções executivas pós-AVC/TCE.
- Uso domiciliar orientado
- Continuidade do estímulo em dias sem sessão;
- Foco em manutenção de ganhos e redução de fadiga mental.
Em ambos os casos, o fonoaudiólogo tem papel central em:
- Selecionar casos – considerando diagnóstico neurológico, tempo de lesão, comorbidades e objetivos funcionais;
- Definir indicadores de resposta – por exemplo, taxa de palavras por minuto, extensão média de enunciados, desempenho em baterias como Teste de Nomeação de Boston, escalas funcionais de comunicação;
- Monitorar segurança e efeito clínico – registrando evolução qualitativa (relato do paciente/família) e quantitativa.
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A FBMt é aliada da reabilitação fonoaudiológica, não substituta
A fotobiomodulação transcraniana não substitui a reabilitação fonoaudiológica baseada em evidências. Ela se propõe a agir “nos bastidores” da neurobiologia, preparando terreno para que o trabalho comportamental tenha mais impacto.
Para o fonoaudiólogo que atua com pacientes neurológicos, conhecer a fotobiomodulação transcraniana, seus mecanismos, suas indicações e limitações é um passo importante para participar ativamente das decisões terapêuticas – e, sobretudo, para oferecer aos pacientes mais uma via de acesso à recuperação da comunicação e da deglutição.

Referências bibliográficas
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